Freguesia da Ponta do Sol

 Freguesia - Ponta do Sol

O autor das Saudade», fazendo a descrição sumária da primeira exploração realizada pelos descobridores através da costa sul desta ilha, diz que João Gonçalves Zarco, metendo-se nos batéis na Ribeira Brava, «chegou a uma ponta que se faz abaixo huma legoa e se vê claro huma vea redonda na mesma rocha com huns rayos que parece sol, deolhe nome o capitam a Ponta do Sol…» Em outra passagem da mesma obra se lê que «…Ponta do Sol se chama assi, por ter uma ponta ao Occidente da villa que tem o parecer… aonde também dá o Sol primeiro que na villa quando nace». Eis a explicação que o cronista apresenta para justificar a origem do nome desta localidade e que na verdade parece plausível, não havendo razões de peso que inteiramente a contrariem. Ignoramos se outros lugares com idêntica denominação, como   uma   localidade  que   existe  na  ilha   de Santo Antão, Cabo Verde, tirariam a origem do seu nome de circunstâncias semelhantes às que ficaram registadas pelo tír. Gaspar Frutuoso.

João Agostinho de Freitas, um inteligente e paciente investigador das coisas do seu rincão natal, não se afasta sensivelmente da opinião de Frutuoso, dizendo que o nome «derivou de um braço ou restinga de rocha viva que, por avançar pelo mar dentro, se chama ponta; e de uma saliência com viezes ou fendas concêntricas, em forma de resplendor, como é costume figurar o Sol, a qual existia na face do rochedo do Passo que fica vertical ao Fojo, junto à dita ponta». E acrescenta: «este rochedo fica ao sueste da villa e não ao occidente, como talvez por erro do copista «e diz no manuscripto do Dr. Frutuoso, que se acha na livraria da Câmara do Funchal».

A Ponta do Sol começou a ser colonizada aproximadamente por 1440. Um dos seus mais antigos povoadores foi Rodrigues Eanes, o Coxo, que, obtendo ali vastos terrenos, estabeleceu uma importante fazenda povoada, que foi a origem e o primitivo núcleo da futura freguesia. Diz-se algures que os terrenos começados a arrotear por Rodrigo Eanes e que lhe foram concedidos em sesmaria, ficavam a oeste da ribeira e se estendiam da orla do oceano até ao Arrebentão, junto ao Paul da Serra.

Conjectura-se que tivesse feito assentamento neste lugar pelos anos de 1450. Não se sabe o ano da sua morte, mas conhecem-se algumas das suas disposições testamentárias feitas a 8 de Abril de 1486, nesta localidade, perante o tabelião do Funchal, João Tavira, e entre elas se encontra a seguinte: «manda que da renda da sua terça lhe façam uma capella em a egreja da Ponta do Sol da parte da mam direita excontra o mar, e sara feita como a de Clara Esteves, que é em egreja de Santa Marta Maior do Funchal, e será da invocação do Espírito Santo e será posta em ella uma imagem do dito Senhor, e vestimenta de seda e cálix  de prata de um marco. Segundo um distinto investigador, que por muitos anos residiu na freguesia da Ponta do Sol e ali faleceu, a capela conhecida pelo nome de Capela do coxo é a de Nossa Senhora do Patrocínio e ali, junto do altar e sob o respectivo madeiramento do soalho, se encontra a sepultura de Rodrigo Eanes. Seria interessante verificar se a epigrafia do túmulo de Rodrigo Eanes confirma estas indicações, pois se afirma que ele expressamente determinara no seu testamento que na inscrição sepulcral se fizesse especial menção de ser ele o fundador do lugar da Ponta do Sol. Conviria mesmo pôr a descoberto o túmulo daquele que tem o seu nome tão estreitamente ligado à primitiva história desta localidade, prestando-se qualquer outra condigna homenagem à sua memória. E à municipalidade da Ponta do Sol que corre é indeclinável dever de tributar esse merecido preito à memória do fundador desta freguesia.

Não se conhece a data da criação desta paróquia. Conjecturamos que seria no terceiro quartel do século XV. É das mais antigas desta diocese.

O diploma mais antigo que acerca desta freguesia temos encontrado citado é o alvará régio de 28 de Agosto de 1559, pelo qual se fixa ao pároco a côngrua de 10$300 réis anuais em dinheiro e um moio de trigo e uma pipa de vinho. Os alvarás de 23 de Julho de 1566, de 13 de Março de 1572 e de 27 de Novembro de 1598 elevaram respectivamente o vencimento anual do vigário a 13$30O, 26$00O e 29$000 réis, além do moio de trigo e da pipa de vinho.

Tinha esta freguesia uma colegiada composta de quatro beneficiados, além de 26 de Agosto de 1589.

A capela de Nossa Senhora da Luz, onde se instalou a sede da paróquia, é de construção anterior à criação desta, ignorando-se o ano em que foi edificada e o nome do seu fundador. Tem sofrido várias modificações e parece que foi quase inteiramente reconstruída e acrescentada no primeiro quartel do século XVIII, segundo se lê nuns Apontamentos que o Dr. Tomé Vieira Barreto deixou exarados num dos livros da igreja paroquial, quando ali foi pároco.

Nesta igreja se venera a imagem de Nossa Senhora da Luz, que é o seu orago, cujo culto especial esteve em tempo muito generalizado nesta e ainda em muitas outras freguesias. Fr. Agostinho de Santa Maria, no tomo X da sua conhecida obra Santuário Mariano, consagra um capitulo ao culto que então se prestava àquela veneranda imagem O padre Miguel Francisco Velosa, vigário desta igreja paroquial, impetrou e obteve da Santa Sé um breve, datado de 30 de Julho de 1805, pelo qual se concede a graça de indulgência plenária, por ocasião da festa do orago, das suas novenas e respectivo oitavário, isto é, desde o dia 30 de Agosto até o dia 15 do mês de Setembro de cada ano, a todas as pessoas que, devidamente, preparadas visitarem a igreja paroquial desta freguesia.

Teve esta freguesia muitas capelas, das quais daremos resumida noticia em outros lugares desta obra.

A freguesia da Ponta do Sol, pelo seu rápido e largo desenvolvimento, atraiu um número considerável de indivíduos, vindos do continente do reino e ainda do estrangeiro, que ali obtiveram multas terras de sesmaria, sendo alguns deles o tronco de importantes casas vinculadas que tiveram sua sede nesta localidade e subsistiram até os nossos dias.. Entre esses indivíduos, citaremos Rodrigo Eanes Furtado, de quem já falámos acima, de nobre linhagem e que teve nesta freguesia larga descendência; Rui Gonçalves da Câmara; D. João Henriques, a cuja família pertence o padre Leão Henriques, havendo ainda hoje um sítio com o nome de Pomar de D. João, que lhe pertencia; Pedro Delgado, que teve sesmaria no Lombo das Adegas; Rodrigo Anes Coelho, da família de Rodrigo Eanes Furtado, que parece ter tido terras no Lombo de São João; Diogo Ferreira de Mesquita, que fundou a capela do Livramento, e ainda outros. Dentre os estrangeiros, podemos lembrar os nomes de João Esmeraldo, de quem já nos ocupámos com alguma largueza, António de Lemes de origem flamenga, cujos descendentes doiram o nome ao sítio dos Lemes, um indivíduo de apelido Schomberg e outros.

Vários morgadios existiram dentro dos limites desta freguesia, devendo mencionar-se o do Espírito Santo e Vale da Bica, de que já nos ocupámos no artigo Lombada dos Esmeraldas, o da Fajã do Furtado, instituído por um descendente de Rodrigo Eanes, o Coxo, o dos Lemes, por António Leme, no sítio que tem o seu nome, o dos Anjos, com sede na capela desta invocação e criado por Martim Afonso, e um Instituído por Diogo Ferreira Mesquita e outro por Ambrósio Berenguer em 1601.

Dos filhos mais distintos da Ponta do Sol, citaremos os nomes do padre Leão Henriques, dr. António da Luz Pita, dr. João Augusto Teixeira, cónego Feliciano João Teixeira e dr. Nuno Silvestre Teixeira. Injustiça seria não recordar aqui o nome de João Agostinho de Freitas, que foi um paciente e distinto investigador da história desta freguesia, tendo deixado alguns manuscritos de valor. Com o título de Resumo da Hera Patriótica, escreveu uma monografia da Ponta do Sol que, por diligência dum dos redactores deste Elucidário, foi publicada nos números 335 a 340 no jornal Brado do Oeste. Nasceu em 1827 e faleceu no ano de 1906. Também não queremos esquecer o nome de Nuno de Freitas Pestana que, como advogado provisionista e nos lugares que desempenhou, revelou não vulgar talento e ilustração.

Uma obra notável que tem esta freguesia é o seu cais de desembarque, mandado construir pela respectiva câmara municipal no ano de 1848. No ano imediato, não estando ainda concluída toda a obra, comunicou o chefe do distrito José Silvestre Ribeiro, ao governo central o empreendimento realizado pela Câmara, pondo em relevo o serviço que ela prestara a esta localidade. Não consta que nenhuma municipalidade se tenha ali abalançado a realizar qualquer outro melhoramento de vulto.

O infante D. Luís, depois rei de Portugal, visitou esta freguesia no dia 25 de Outubro de 1858, dirigindo-se à pitoresca estância do Rabaçal e regressando a esta vila no dia imediato. Tanto a chegada como na volta do Rabaçal, almoçou, bem como a comitiva, na residência do considerado pontassolense. Nuno de Freitas Pestana. Desembarcou e embarcou no Lugar de Baixo, por o mau estado do mar não o permitir fazer no cais da vila.

«A Ponta do Sol como freguesia, diz João Agostinho de Freitas, estendia-se por todo o território desde a ribeira da Tabúa, a leste, até à ribeira da Magdalena, a oeste. Depois, não se sabe a época precisa, mas supõe-se que seria pelos anos de 1510 ou ainda alguns anos mais tarde, sendo criadas as paróquias da Magdalena e dos Canhas, a oeste, e a da Tábua, a leste, ficou o território da Ponta do Sol rduzido a uns tantos kilómetros de costa, isto é, desde a foz da ribeira do Alto, limite dos Canhas, até à foz da ribeira da Caixa, limite dá Tabúa».

Os principais sítios desta freguesia são: Vila, Ribeira da Ponta do Sol, Lombo das Terças, Lemes, Lombo das Adegas, Pomar de D. João, Lombo de S. João, Fregueses Novos, Ribeira da Lombada, Lombada, Entre Caminhos, Jangão e Lugar de Baixo.

O censo da população de 1920 dá a esta freguesia 6.190 habitantes.

No livro Na Madeira-Offerendas, de D. Mariana Xavier da Silva, publicado em Lisboa no ano de 1884, encontram-se as narrativas O Rapazinho da Lombada, A Virgem das Dores e Ponta do Sol, que interessam à história e costumes desta freguesia.
Fonte, Elucidário Madeirense, vol. III, pp. 92-94.

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